vesuviografia

visível há de ser este poema

se não for escavado,

se o que ele guarda sob o verbo em cinza

(usos exóticos, datados

como a alegria)

permanecer precioso

em sua reserva;

se o que dói também for tomado por tesouro,

ainda que o não fosse

se a cinza o não tivesse sepultado

(ao invés da alegria

esse uso tão primitivo,

imemorial)

caça ao leão com arco

como fugir da dispersão causada

pelo marasmo, pelo ramerrão,

pelo desplante face ao património

sincero, fresco e tão feroz da infância?

            há de esse fruto ser deitado fora

            com todo o pelo em que se descoroa?

                        lei há nenhuma em terras vegetais

                        que em terras animais não possa ser

                        a liberdade apenas entrevista

                        nas lendas sobre as terras minerais

            como caçar a dispersão erguida

            na arquitetura da imaginação

            – o firme instante canopial?

a mera brisa, nada mais que a brisa,

será bastante para retirar

a um rei da selva quase literal

todos os dentes com que se define?

Hipólito, Delfim

Há, pois, que ousar falar do gosto da questão

do tom que usou Hipólito com seu Delfim:

“não me deixes (imploro-te) fora de mim

de toda esta atrelagem faz afirmação

sê manada de cascos danando-me em chão

sê sopro violento, arado verbatim

sulcando o que é já sulco (lavra por palavra)

sê qualquer outro horror, mas efémero – não,”

Delfim com seu Hipólito usou modos tais

que nenhum verso pode fazer jus ao verbo:

“serei em tua areia arriba que derrui

deixando em suspensão alas colaterais

serei o nome Páscoa em língua rapa nui

serei qualquer horror, efémero – jamais

(ton) (cht)

Busco na minha experiência

recursos que me permitam

expandir a imaginação

Bárbaro falhanço –

resta pouco para

entender o que terá sentido um escravo

Serenarium

Sei que jaz um poema nesta página –

uma medida insiste (espectral)

ainda que mal encha o branco em espaço

chamemos-lhe ruína nunca rima

à toada que de dentro sai-não-sai

mas se eu sei que um poema jaz na página –

é só porque entre núcleo térreo e sol

entre leito e lençol superficial

toda a floração teve por semente

somente cinza, só clamor em pó

Pedro Ludgero is a writer and filmmaker born in Porto (Portugal) in 1972. He has published poetry, plays, texts for children, and commentary on cinema.
He is currently producing his seventh short film.

The five texts shared here are part of the poetry book he is currently working on. Two of them are published on the blog ludgeroantologia.blogspot.com, a site where the author presents an anthology of his own lyrical work.